Mercado não dá atenção à guerra comercial
- Olívia Bulla
- há 1 dia
- 2 min de leitura

O mercado financeiro encerra a semana tendo na agenda do dia o IPCA de março e os balanços de grandes bancos em Wall Street. Mas desde o anúncio das “tarifas recíprocas”, os mercados estão libertos do calendário econômico. É algo que ficou nítido já com o dado de inflação nos Estados Unidos, ontem. Até porque com os produtos chineses importados para os EUA custando mais que o dobro, os números do CPI são, no mínimo, falsos.
A escalada da guerra comercial contra a China chegou a um patamar tão absurdo que o governo chinês decidiu largar a mão e não dar mais atenção às medidas da administração Trump. Ao anunciar a retaliação, impondo uma tarifa equivalente de 125% sobre produtos importados norte-americanos, a China disse que se os EUA continuarem a impor taxas adicionais, irá simplesmente ignorá-las.
Afinal, não há mais a possibilidade de aceitação no mercado chinês de produtos norte-americanos exportados para a China considerando-se os níveis tarifários atuais. A pergunta que fica é: os EUA (e as empresas norte-americanas) podem fazer o mesmo? Ou os consumidores do país terão de arcar com produtos “Made in China” custando duas vezes (e um quarto) a mais que o preço original?
Conta simples de padaria
Daí porque o custo da disputa tarifária iniciada por Donald Trump é mais doméstico do que externo. A perda de confiança dos empresários e dos cidadãos dos EUA na política econômica da Casa Branca é crescente. E o recuo de Trump na quarta-feira em relação às tarifas ao mundo - exceto contra China - revelou uma crise interna em Washington. No entanto, esse movimento não conseguiu aliviar os impactos nas empresas e na população.
Ou alguém aqui ainda acha que a Apple, empresa mais valiosa do mundo até o início desta semana, teria essa escala sem a China? É de lá onde saem 90% dos 200 milhões de iPhones vendidos no mundo. Dados do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) mostram que em 2023, quase 30% das exportações chinesas foram de bens fabricados por empresas estrangeiras instaladas na China.
A Apple é apenas um dos exemplos de grandes multinacionais norte-americanas que organizaram linhas de fábrica na China, em meio à transição nos EUA da manufatura para o setor de serviços e inovação. Ou seja, os produtos da Apple e de várias outras empresas dos EUA que produzem na China - e outros países asiáticos - terão aumento de preços, pesando sobre o consumidor. A outra opção é forçar as empresas norte-americanas a reduzir suas margens.
Resultado final
Com isso, as perdas moderadas exibidas pelos futuros dos índices acionários norte-americanos e a aposta de que as grandes ações de tecnologia em dificuldades, como a Nvidia, podem ser refúgios disfarçados são uma falácia, tal qual os números do CPI ontem. O índice, aliás, apontou deflação nos preços no mês passado e desaceleração na taxa acumulada em 12 meses.
Fato é que os mercados globais ainda não reiniciaram a máquina e continuam fazendo a coisa errada. Assim, qualquer alívio nos ativos de risco hoje será apenas para respirar no fim de semana.