A Interdição do Posto Ipiranga
Paulo Guedes subiu no telhado. O economista ultraliberal tem-se prestado nos últimos meses ao papel de tentar legitimar o candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro, perante a mídia oligárquica e aos atores do mercado financeiro. Alguns dias atrás, Miguel Lago publicou na Piauí um artigo elucidativo sobre o tema.
Era uma missão ingrata a de Paulo Guedes. Desde o impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992, os mercados e a mídia são fechados com o PSDB, chova ou faça sol. E a esperança de que algum aromatizante artificial desse sabor ao Picolé de Chuchu persistiu até os acréscimos do segundo tempo.
Geraldo Alckmin atraiu para si o chamado Centrão, aquele amontoado de partidos e caciques apolíticos cujos interesses particulares e proselitistas falam sempre mais alto do que qualquer outra coisa. Conseguiu assim mais da metade de todo o tempo de TV. Mais tempo do que o de todos os seus adversários juntos.
- Agora vai! - pensaram alguns.
A bolsa subiu, o dólar caiu e as pesquisas de intenção de voto…
Bem, nas pesquisas de intenção de voto, Alckmin e o plano B palatável à mídia e aos mercados, Marina Silva, até ensaiaram um voo de galinha, mas logo desidrataram. Jair Bolsonaro seguiu firme na liderança e Lula transferiu votos a Fernando Haddad e em menor escala a Ciro Gomes.
Aos olhos do mercado e dos grandes grupos de mídia, Ciro Gomes não rola. Quanto a Haddad, eles não fizeram tudo o que fizeram para, na hora H, abraçar o PT, por mais dinheiro que possam ter feito nos anos Lula e no primeiro mandato de Dilma.
Vivemos um momento da história no qual a neutralidade é um crime. E, dependendo do caso, tomar posição pode resultar em um crime hediondo. Quem apoiar então?
Até mesmo a conservadora The Economist, revista semanal britânica considerada a bíblia do capitalismo, advertiu em sua última capa para o risco iminente diante do Brasil e da América Latina com a liderança de Bolsonaro nas pesquisas de intenção de voto para o primeiro turno. Mas os agentes do capitalismo financeiro não ligam muito para os riscos quando não é do interesse deles.
A questão entre os operadores do mercado era: como migrar o apoio de Alckmin a Bolsonaro sem fazer isso parecer um escândalo?
A resposta estava em Paulo Guedes, o ultraliberal responsável pela área econômica dos planos de Bolsonaro. Seu provável ministro da Economia caso suba a rampa do Palácio do Planalto, em um superministério que teria sob o seu guarda-chuva as atuais pastas da Fazenda, do Planejamento e do Desenvolvimento.
Dizia-se até que teria carta branca na condução da economia e controle sobre o chefe. Não tardou a ganhar a carinhosa alcunha de “Posto Ipiranga”, pois toda vez que Bolsonaro era perguntado sobre algum tema econômico a resposta era para consultar seu guru, em outros tempos apelidado de “Beato Salu”.
Eis que com o candidato fora de cena por causa do ataque a faca sofrido no início de setembro, Guedes e o vice na chapa, o General Mourão, assumiram o protagonismo da campanha.
E se Bolsonaro, de boca fechada, é um poeta, Guedes e Mourão são candidatos ao Nobel. Enquanto o primeiro falava em trazer de volta a CPMF e estabelecer uma faixa única de imposto de renda – o que obviamente recairia no lombo das classes baixa e média –, o segundo já adiantava até a possibilidade de um autogolpe, entre outros delírios autoritários entremeados por chavões preconceituosos.
De sua cama no hospital, o capitão desautorizou o general e interditou o Posto Ipiranga. Aos olhos de quem trabalha com campanha eleitoral, Guedes e Mourão podem até pensar assim e ter os planos que dizem ter. Só não podem contar para os eleitores antes que os votos estejam lá bem guardadinhos nas urnas.
E enquanto Bolsonaro insiste no conto-da-carochinha de que se ele perder é porque houve fraude, os olhos se voltam para Paulo Guedes. Ele conseguiu o mais difícil: tornar Bolsonaro palatável aos agentes dos mercados financeiros e aos donos dos grandes grupos de mídia. Mas o propalado controle sobre Bolsonaro já se sabe que ele não tem.