Hoje China, amanhã Brasil
A segunda metade de outubro começa com dados de inflação na China, que reforçam a perspectiva de crescimento econômico no país, embalando os ativos de países emergentes e as commodities industriais. O sinal positivo prevalece nos mercados internacionais hoje, diante da resiliência da demanda chinesa, mas a semana reserva ajustes às apostas de uma nova alta na taxa de juros nos Estados Unidos e uma agenda política complicada no Brasil.
As principais bolsas avançam no exterior, com a Ásia ainda repercutindo os dados de inflação no EUA divulgados na sexta-feira, que mostraram pressão limitada nos preços e reduziram as chances de um aumento no juro norte-americano em dezembro. Ao mesmo tempo, a inflação ao produtor chinês (PPI) cresceu mais que o esperado em setembro, em +6,9%, enquanto os preços ao consumidor (CPI) desaceleram a 1,6%, conforme previsto.
Os índices futuros das bolsas de Nova York estão em alta nesta manhã, embalando uma abertura da Europa no azul, em meio a um novo rali das commodities. O cobre negociado em Xangai alcançou o maior nível desde abril de 2013, ao passo que o metal cotado em Londres se aproxima da máxima em mais de três anos. O petróleo também estende os ganhos, refletindo as preocupações com a produção nos campos do Iraque.
A segunda maior economia do mundo volta à cena nesta semana para divulgar os indicadores de atividade, com destaque para os números consolidados do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre deste ano, na quinta-feira. Na última sexta-feira, o gigante emergente divulgou dados robustos da balança comercial, que tem sido importante para o crescimento econômico do país, evidenciando também um aumento da demanda interna.
Ainda na China, destaque para o 19º Congresso do Partido Comunista, que começa na quarta-feira. Também no exterior, merecem atenção o desempenho da produção industrial norte-americana, amanhã, e o Livro Bege, na quarta-feira, após a frustração com as vendas no varejo e a inflação ao consumidor nos EUA, que enfraqueceram a mensagem do Federal Reserve de normalização gradual dos juros.
A temporada norte-americana de balanços ganha força e traz os resultados financeiros dos bancos Morgan Stanley e Goldman Sachs, além de Netflix e General Eletric. No Brasil, o foco dos investidores continua dividido entre os indicadores econômicos e os eventos políticos.
Recapitulando os acontecimentos recentes, no mercado financeiro, o grande destaque é a Bovespa, que vem cravando sucessivos recordes - o último foi na sexta-feira, em plena emenda de feriado prolongado - e está cada vez mais perto dos 80 mil pontos. A aposta é de que esse nível seja alcançado até o fim do ano, caso os investidores estrangeiros mantenham o apetite por ações de empresas brasileiras - leia-se bancos e mineradoras.
O movimento dos “gringos” na renda variável doméstica foi estimulado, principalmente, pela perda de atratividade nos rendimentos da renda fixa, diante da trajetória cadente da taxa básica de juros do país. A liquidez global elevada em termos de recursos financeiros continua buscando retornos atrativos, ainda que assumindo maiores riscos.
Em relação à política monetária, a mudança na composição do Fed no ano que vem – inclusive com a substituição da presidente Janet Yellen – deixa dúvidas sobre o processo de alta da taxa de juros norte-americana ao longo de 2018. No Brasil, a Selic deve encerrar 2017 em um novo mínimo histórico, de 7%, com o Banco Central desacelerando o ritmo de cortes para 0,75 ponto neste mês.
A participação do presidente do BC, Ilan Goldfajn, em um evento em São Paulo nesta manhã devem corroborar esse cenário. A insistente e surpreendente trajetória de queda da inflação já permitiu ao BC cortar os juros básicos em 6 pontos desde o início do ciclo de cortes. Nem mesmo o aumento de preço na gasolina e na conta de luz tem comprometido o desempenho do IPCA neste ano, que segue beneficiado pelo efeito climático nos alimentos.
Na sexta-feira, porém, a prévia do indicador (IPCA-15) neste mês deve acelerar para perto de 0,4%, refletindo, justamente, um aumento nos gastos com alimentação no domicílio. Antes, na quarta-feira, é esperado o indicador de atividade do BC (IBC-Br), que deve confirmar o crescimento econômico do país no terceiro trimestre de 2017. Hoje, saem as tradicionais publicações do dia: Pesquisa Focus (8h25) e balança comercial semanal (15h).
Olhando à frente, a inflação brasileira tende a seguir ancorada em 2018, oscilando em torno da meta de 4%, o que pode permitir à Selic cair um pouco mais na virada do ano, em meio à ausência de pressão vinda da demanda doméstica, por causa do ajuste lento no mercado de trabalho. Mas mesmo com 13,5 milhões de desempregados no país, a expectativa é de um crescimento econômico mais robusto no ano que vem - certamente, não pela via do consumo interno.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, já fala em expansão de até 3% do PIB em 2018, chegando a 4% nos anos seguintes. Cada vez mais em tom de campanha, ele também afirmou que aprovar a reforma da Previdência ainda em 2017 é uma "questão de bom senso". Afinal, "seria muito ruim" deixar para discutir e aprovar essa matéria para quem assumir o próximo governo.
As agência de classificação de risco já avisaram que podem promover um novo rebaixamento da nota brasileira (rating), se as novas regras para a aposentadoria não forem aprovadas a tempo de darem um espaço para o próximo governo. Tal alerta até poderia reforçar a urgência da reforma, mas as atenções em Brasília estão divididas entre a votação da Previdência e a análise da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer.
Antes, o Senado deve salvar o mandato de Aécio Neves, após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte foi acusado de ceder às pressões dos senadores e adotar uma posição política, ao entender que medidas cautelares devem ter o aval do Legislativo. Agora, a Casa articula uma votação secreta para deliberar sobre o pedido de prisão do candidato derrotado na eleição de 2014, de modo a evitar mais desgaste.
No cenário político, então, o que importa são as cenas dos próximos capítulos, que devem manter a trama e a sensação de certa ilusão que vem sendo vendida pelo governo e comprada no mercado financeiro - e vice-versa. Afinal, ao que tudo indica, os motivos que têm levado os investidores a tomar o risco Brasil são, em larga medida, os sinais de fraqueza da economia (e da política) nacional - e não o contrário.