Sorte ou revés?
O governo Temer não colecionou apenas vitórias ontem na Câmara, evidenciando a dificuldade em aprovar as medidas. A aprovação do texto da reforma trabalhista na comissão especial, por 27 votos a 10, pode até trazer um alívio passageiro aos mercados domésticos nesta quarta-feira, em meio ao rali nos negócios no exterior. Mas a derrota na votação sobre a renegociação das dívidas dos Estados pode pesar.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, encerrou a sessão sem concluir a votação dos destaques do projeto de recuperação fiscal dos Estados, após o governo ser derrotado em uma das principais emendas por insuficiência de votos. Trata-se da contrapartida de aumento da alíquota de contribuição da Previdência Social aos servidores estaduais.
Ao sair do plenário, Maia afirmou que a pauta será retomada apenas na semana que vem, pois, hoje, a Casa deve votar a reforma trabalhista. Espera-se que o governo consiga manter a base aliada mobilizada em plenário, de modo a evitar novas alterações no texto que mexe nos direitos dos trabalhadores.
A votação será mais um teste de resistência do governo em propostas polêmicas, que cada vez mais perdem apoio entre os partidos governistas. Um dia após o PSB fechar questão e se posicionar contra as reformas trabalhista e previdenciária, foi a vez do deputado Paulinho da Força afirmar que o Solidariedade deixará a base se o texto sobre as novas leis de trabalho não mudar.
O partido cobra alterações no trecho que prevê o fim do imposto sindical e propõe uma extinção progressiva e não imediata. O PSB possui 35 deputados e o Solidariedade, 14. Trata-se de uma soma de votos importante, em um momento em que o governo faz as contas para aprovar votações importantes, que precisam tanto de maioria simples quanto de mais de 300 votos para serem encaminhadas ao Senado.
O mercado doméstico ainda não jogou a toalha e aposta na articulação política do presidente Michel Temer para garantir os votos necessários à aprovação de ambas as reformas. Mas a movimentação política nos bastidores mostra que o governo não tem garantia de apoio da base aliada.
Se fosse assim, não haveria a necessidade de Temer exonerar mais de 10 ministros com mandatos de deputado para elevar o número de votos a favor. Tampouco seria necessária a exigência de o próprio partido do presidente fechar questão em prol das medidas. Afinal, ou Temer garante o apoio incondicional do PMDB ou vai ser difícil convencer demais os aliados.
Em meio a esses sinais, os investidores tendem a manter o desconforto e só devem resgatar a confiança quando houver garantias de que a situação na Câmara está sob controle. Para tanto, é fundamental a aprovação da reforma trabalhista no plenário da Casa hoje.
Já as negociações sobre as novas regras para a aposentadoria tendem a se estender até a próxima semana e, por mais que Temer tenha endurecido o discurso, dizendo não haver espaço para mais concessões, novos ajustes são inevitáveis. E, nesse cenário, os protestos marcados para os próximos dias contras as reformas podem testar o futuro do governo Temer.
Tudo indica que os parlamentares estão mais preocupados com as eleições em 2018 e temem o impacto dessas medidas impopulares nas urnas. A avaliação é de que os deputados devem aguardar a adesão das manifestações programadas para esta sexta-feira e também para o feriado na segunda-feira que vem para decidir se vão apoiar o governo ou se posicionarem contra.
Assim, a adesão de várias categorias e o tamanho da mobilização podem definir os votos. Por enquanto, nove centrais sindicais se uniram para organizar a paralisação em todo o país e a intenção é dar um recado ao governo e ao Congresso contra as reformas trabalhista e da Previdência e também contra a Lei da Terceirização.
Em São Paulo e no Rio de Janeiro, os ônibus e os trens do metrô devem parar por 24 horas, o que deve intensificar o impacto da greve geral. A paralisação também deve ter adesão de parte do setor privado, como dezenas de escolas particulares aderindo à greve geral e gerando revolta entre os pais.
Categorias fortes, como as dos bancários e dos metalúrgicos, também garantem uma paralisação nos bancos e das montadoras, ainda que por algumas horas. Em uma contraofensiva, o Palácio do Planalto mandou monitorar a mobilização entre os servidores públicos e autorizou "cortar o ponto" para quem parar e não for trabalhar no dia 28. A mesma medida foi tomada pelo prefeito da capital paulista, João Doria Jr.
Já a agenda econômica doméstica do dia segue fraca, porém reserva uma série de indicadores. Logo cedo (8h), a FGV anuncia as sondagens de abril da construção civil e do consumidor, além do índice sobre os custos na construção (INCC-M). Ainda pela manhã, o Banco Central publica (10h30) a nota sobre operações de crédito em março.
Depois, a autoridade monetária volta à cena para informar os dados semanais do fluxo cambial (12h30). No exterior, o calendário econômico também está esvaziado e traz apenas os estoques semanais de petróleo bruto e derivados nos Estados Unidos, às 11h30.
Mas a grande expectativa lá fora é pelo plano de corte de impostos do presidente norte-americano, Donald Trump. O anúncio do pacote está prometido para hoje e os mercados internacionais torcem para que, desta vez, Trump cumpra o que prometeu e entregue uma reforma tributária satisfatória às vésperas dos seus primeiros 100 dias de mandato.
À espera de um grande plano fiscal do republicano, os índices futuros das bolsas de Nova York reduzem o entusiasmo e ficam na linha d'água, o que também encurta o fôlego entre as praças europeias, após uma sessão positiva na Ásia. A safra de balanços também tenta garantir o otimismo entre os investidores.
O dólar, por sua vez, mede forças ante as moedas de países desenvolvidos, como o euro e o iene, e também em relação às divisas de países emergentes. Enquanto o ringgit malaio e a rupia indiana são destaques de alta, o dólar australiano recua, refletindo os dados de inflação no país. O dólar canadense também perde terreno, após Trump intensificar a disputa comercial com o Canadá.
Essa falta de direção única da moeda norte-americana atrapalha o desempenho das commodities. O petróleo segue negociado abaixo de US$ 50, à espera dos números sobre os estoques da commodity nos EUA e também de sinais do cartel de países produtores (Opep) em relação à extensão dos cortes de produção. O sinal negativo também prevalece entre os metais básicos.