A realidade Temer
A semana encurtada pelo feriado no Brasil e no mundo na quinta-feira começa com os mercados domésticos reagindo à entrevista coletiva concedida pelos ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Romero Jucá (Planejamento) ao final da sexta-feira passada, quando anunciaram uma situação da economia pior que o imaginado. Os números realísticos encontrados pela equipe econômica, após “cavucar” o buraco das contas públicas para descobrir o quão profundo ele é, culmina em rombo de R$ 170,5 bilhões neste ano.
Se confirmado, será o terceiro ano consecutivo que o orçamento do governo irá fechar no vermelho. Além disso, o Produto Interno Bruto (PIB) deve recuar 3,8% neste ano, na segunda retração consecutiva e no maior recuo acumulado em dois anos em várias décadas, enquanto a inflação deve seguir fora do intervalo da meta pela segunda vez, encerrando 2016 em 7%.
Essa “herança” deixada pelo governo da presidente afastada, Dilma Rousseff, demanda um trabalho árduo da equipe econômica. Mas, por enquanto, não foram divulgadas soluções para reequilibrar o déficit fiscal nem medidas que envolvam desde alta de impostos à redução da máquina pública. Na primeira semana do governo interino, o presidente em exercício Michel Temer e seus ministros mais acumularam declarações polêmicas, que logo tiveram de ser desfeitas, do que qualquer outra coisa.
No último sábado, Temer deu sinais claros de que não vai conseguir entregar o que prometeu, resgatando a confiança no Brasil, por um motivo simples: falta de clima político no Congresso e ausência de apoio popular nas ruas. Assim, os primeiros anúncios para salvar a economia não envolverão nem aumento de impostos, como recriação da CPMF, nem a reforma da Previdência, que aumentaria a idade mínima das mulheres - que representam 66,1% da população fora da força de trabalho - para aposentar.
As medidas que restaram devem ser conhecidas apenas amanhã, para antes serem apresentadas ao presidente do Senado, Renan Calheiros - o que deve acontecer hoje. O novo ministro da Fazenda – o terceiro no cargo desde que o mais longevo da Pasta, Guido Mantega, saiu do comando - afirmou que o governo precisa adotar medidas "fortes e decisivas", já que o déficit acima do esperado acentua a necessidade de ações para reverter o cenário, rumo a um "círculo virtuoso". Hoje pela manhã, Meirelles participa de um seminário em São Paulo para falar sobre "o Brasil que queremos".
Mas os mercados financeiros têm pressa e mostram dificuldade em aceitar que o tempo da política é diferente do tempo da economia. Nesse vaivém, a Bovespa perdeu a faixa dos 50 mil pontos, o que não acontecia desde o início de abril, ao passo que o dólar firmou-se acima da marca de R$ 3,50. Esse movimento reflete a incerteza dos investidores, que fizeram uma “parada técnica” nos ativos brasileiros, aguardando o anúncio de medidas.
No contexto internacional, tudo se trata de Federal Reserve, e sem alívio. As atenções globais se voltam para a participação da presidente do Banco Central norte-americano, Janet Yellen, em uma conferência na Universidade de Harvard (EUA), apenas na sexta-feira. A fala dela será observada atentamente, pois será a oportunidade para suavizar ou intensificar a impressão deixada na semana passada em relação a mais um aperto dos juros em junho – e o Fed tem sido claro nas suas mensagens.
Yellen fala no mesmo dia em que será conhecida a segunda estimativa do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos no primeiro trimestre deste ano. E a expectativa é de aceleração no dado, ante a prévia anterior, que mostrou expansão de 0,5% na taxa anualizada. Também na sexta-feira, sai a confiança do consumidor norte-americano.
Hoje, os presidentes das distritais de Saint Louis, São Francisco e da Filadélfia discursam ao longo do dia e as falas de cada um também serão monitoradas atentamente, em buscas de pistas sobre a possibilidade de elevar os juros no próximo mês. Afinal, o risco para um aperto segue presente, mas a economia instável na China e o referendo do Reino Unido sobre a permanência na União Europeia (UE) podem levar o Fed a esperar mais um pouco. Por ora, as apostas de uma nova alta em junho estão em 28%, de 4% de chance uma semana antes.
Cientes disso, os índices futuros das bolsas de Nova York são negociados em alta nesta manhã, a despeito da queda do barril de petróleo para abaixo de US$ 48, após o Irã afirmar que não irá congelar a produção até que o escoamento da commodity volte aos níveis pré-sanção. As bolsas europeias também estão no azul, apesar da queda do minério de ferro por causa dos estoques elevados na China e do recuo do cobre à mínima em três meses.
O destaque na região fica para a oferta não solicitada de US$ 62 bilhões feita pela alemã Bayer para comprar a norte-americana Monsanto, criando a maior fornecedora mundial de produtos químicos agrícolas e sementes geneticamente modificadas. As ações da Bayer caíam mais de 3%, sendo negociada no menor nível em dois anos e meio.
Nos mercados emergentes, as bolsas e moedas mantêm a recuperação observada na última sexta-feira, embaladas pelos ganhos da Bolsa de Xangai, que subiu 0,64%, após uma sessão volátil. Aliás, o calendário econômico na China está mais fraco nesta semana, assim como na zona do euro e no Brasil.
O destaque doméstico fica com os números do Banco Central sobre o setor externo, na quinta-feira, e do Tesouro Nacional sobre a dívida pública federal, no dia seguinte. Hoje, têm uma nova leitura do IPC-S (8h), o Boletim Focus (8h25) e os dados semanais da balança comercial (15h).