Queda de braço entre BC e mercado
Nem meio ponto nem 0,25. Por 6 votos a 2, o Comitê de Política Monetária (Copom) optou por manter a taxa básica de juros (Selic) em 14,25% ao ano, pela quarta reunião seguida, em uma decisão que não deve ser perdoada pelos mercados domésticos hoje. Após o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, mudar o discurso sobre o juro no primeiro dia de reunião do colegiado, a postura ainda mais suave (“dovish”) da autoridade monetária deve pegar mal entre os investidores, em um momento de reduzida credibilidade do BC e de extensão da aversão ao risco no exterior.
A decisão do Copom, que foi acompanhada de um comunicado enxuto, atribuiu à "elevação das incertezas domésticas e, principalmente, externas" a manutenção da Selic, sem viés, levando-se em conta ainda o "cenário macroeconômico, as perspectivas para a inflação e o atual balanço de riscos". Votaram novamente pelo aumento da taxa para 14,75%, os diretores Sidnei Corrêa Marques e Tony Volpon.
Contudo, a decisão realimenta as incertezas com o cenário econômico doméstico, diante dos temores de que o BC conduza uma política monetária nos moldes do primeiro mandato do governo Dilma – que, para o mercado, desencadeou a atual crise fiscal. Além disso, a polêmica em torno do anúncio renova as suspeitas de que a autoridade monetária não tem autonomia e sofre ingerência política por parte da presidente Dilma Rousseff, cedendo às pressões do PT.
Após os sinais confusos emitidos pelo Comitê desde o último encontro de 2015, em novembro, o mercado dava como certa a prioridade do BC em convergir a inflação ao centro da meta, que passa para 4% no ano que vem. Na primeira reunião de 2016, porém, o colegiado optou por não aprofundar ainda mais a recessão no Brasil (nem as despesas do governo com a dívida pública), apesar dos riscos de estourar o teto para a alta dos preços mais uma vez neste ano. E, assim, manteve os juros no maior nível desde outubro de 2006.
Sem pistas no comunicado sobre os próximos passos da política monetária, os negócios locais devem repercutir com intensidade essa decisão do Copom hoje, um dia após o dólar fechar acima de R$ 4,10, no maior nível desde setembro, e de a Bovespa seguir no menor patamar desde março de 2009, em meio à piora da percepção de risco no Brasil e à maior aversão ao risco no exterior.
Aliás, as perdas seguem aceleradas entre os ativos de risco nos mercados internacionais, ao mesmo tempo que prossegue a busca por proteção. A injeção de 400 bilhões de yuans (US$ 61 bilhões) pelo Banco Central chinês (PBoC) nas operações de mercado monetário hoje falharam em aliviar a pressão nos negócios. Ao contrário, elevaram as preocupações com a desaceleração econômica na China, resultando em quedas de 3,25% do índice Xangai Composto e de 2,93% do CSI 300. Hong Kong perdeu 1,51% e Tóquio caiu 2,43%. Na Oceania, a Bolsa de Sydney entrou em mercado de baixa (bear market).
O BC chinês está preocupado com a proximidade do Ano Novo Lunar, no início de fevereiro, e conduziu operações de acordo de recompra de sete e de 28 dias, nas quais colocou 110 bilhões de yuans e 290 bilhões de yuans, respectivamente. Trata-se do maior valor em cerca de três anos, com um saldo líquido nesses instrumentos de empréstimo de cerca de 1 trilhão de yuan. A expectativa é de que o principal feriado na China eleve a demanda por dinheiro para aproximadamente 3 trilhões de yuans.
Nos mercados emergentes, a onda vendedora (selloff) não mostra qualquer sinal de melhora, com o barril do petróleo seguindo nos menores níveis em mais de 12 anos, em meio à perspectiva de que a desaceleração da economia global está piorando. As bolsas e moedas desses países exibem fortes perdas, com destaque para o mercado acionário nas Filipinas, que caiu à mínima em 23 meses, e para ao rand sul-africano, que lidera as perdas.
O sinal negativo deve contaminar a abertura do pregão das bolsas no Ocidente, com os índices futuros das bolsas de Nova York exibindo perdas, de pouco mais de 0,5%. As principais bolsas europeias também iniciaram a sessão no vermelho, com as atenções voltadas para a reunião de política monetária do Banco Central Europeu (BCE).
Após frustrar os investidores, não entregando em dezembro o “presente de Natal” prometido, as expectativas para o BC da zona do euro hoje estão mais moderadas. Novas medidas são esperadas somente para março. Hoje, o anúncio da decisão será feito às 10h45 e, às 11h30, o presidente da instituição, Mario Draghi, concede entrevista à imprensa, na qual deve reafirmar o compromisso de mais estímulos, se necessário.
Antes, às 8 horas, sai a leitura final de dezembro dos preços ao consumidor (CPI) na região da moeda única. Depois, às 13 horas, é a vez da prévia do mês sobre o sentimento do consumidor. Já nos Estados Unidos, saem os pedidos semanais de auxílio-desemprego e o índice regional de atividade na Filadélfia, ambos às 11h30. Às 14h, é a vez dos estoques semanais norte-americanos de petróleo bruto e derivados, que serão divulgados hoje – ao contrário do informado ontem. Na safra de balanços, são os resultados trimestrais de Travelers, Verizon e United Continental, antes da abertura do mercado, e os da American Express, após o fechamento do mercado.
E a agenda econômica esvaziada hoje no Brasil abre espaço para os ajustes nos ativos domésticos. São esperados apenas os dados sobre as vagas de emprego na economia brasileira em dezembro e em 2015 com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), às 11h. Os números do mercado de trabalho devem reforçar os motivos por trás da decisão do BC, já que é esperada uma piora adicional na geração de postos de trabalho ao longo de 2016.
Entre os eventos de relevo, destaque para o painel que o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, participa, durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, sobre “como reiniciar a economia mundial”, a partir das 9h30 (de Brasília). Depois, ele reúne-se com o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Jacob Lew, entre outros compromissos no dia.
Ontem, na cidade suíça, Barbosa disse contar com a aprovação da CPMF até maio, que ajudará nas contas públicas. Sobre as revisões do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o desempenho da economia brasileira - as quais o BC considerou "significativas" - o ministro disse que o importante é estabilizar o nível de atividade, rumo à recuperação, puxada sobretudo pelo investimento. Já em relação ao BC, ele disse, ainda antes da decisão, que a autoridade monetária tem autonomia para administrar os juros como achar adequado.