Os reflexos da política na economia
A instabilidade institucional no Brasil se aprofunda e a confusa conjuntura política-econômica local deve manter os mercados domésticos em alerta hoje, dia seguinte à decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) e de anúncio da taxa de desemprego no país. Mas após a entrega de um novo pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, a expectativa recai, agora, na análise da petição - que pode ganhar força por acrescentar as supostas “pedaladas fiscais” cometidas neste ano.
Ao receber o documento, Cunha prometeu analisar o pedido com “total isenção”. Ele, aliás, foi poupado pelos líderes do movimento contra o mandato de Dilma, apesar das suspeitas de envolvimento do parlamentar no escândalo de corrupção na Petrobras e da comprovação da existência de contas secretas em seu nome no exterior. Enquanto isso, a oposição tenta emplacar a corrente “Natal sem Dilma”.
No Senado, o presidente Renan Calheiros disse que a tramitação do parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) pela rejeição das contas do governo federal no ano passado irá evitar a nulidade do processo, dando a Dilma o amplo direito de defesa. Ele decidiu manter a ideia inicial e deu um prazo de 45 dias para o governo se defender na Comissão Mista de Orçamento (CMO).
Em meio a essa porosidade entre os Poderes, o Executivo não consegue emplacar a pauta do ajuste fiscal e diante da perspectiva de frustração da arrecadação, a meta de superávit primário de 2015 deve ser novamente revista. A previsão é de que um novo anúncio seja feito até amanhã. Segundo o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, “ainda não há nenhum número consolidado”.
A questão é que uma nova revisão no esforço fiscal deste ano pode provocar um “efeito multiplicador” entre as agências de classificação de risco. Afinal, a perda do selo de grau de investimento do Brasil pela Standard & Poor’s (S&P) ocorreu na esteira da diminuição da meta.
Além disso, uma economia menor para o pagamento de juros da dívida pública neste ano lança dúvidas em relação ao alvo para 2016 – que pode ser colocado em xeque diante de uma capacidade reduzida de recuperação fiscal. Para tanto, seria necessário o recolhimento da CPMF já no início do ano que vem, mas o projeto não deve ser votado antes de junho.
Com uma postura vigilante a todo esse cenário, o Copom optou ontem por manter a taxa básica de juros (Selic) em 14,25% ao ano, pela segunda reunião consecutiva. Totalmente esperada, a decisão da autoridade monetária sinaliza que o atual balanço de riscos estaria incólume aos efeitos da questão fiscal, da depreciação do real e da atividade em baixa - ou que o Banco Central jogou mesmo a toalha, sem ter muito o que fazer.
O comunicado que se seguiu à decisão repetiu o conteúdo do encontro anterior, deslocando as atenções para a ata, na semana que vem. Os investidores esperam que, no documento, o BC apresente as razões para tal estratégia, por período suficientemente prolongado, bem como exponha o que passa na cabeça do colegiado nesse momento de incerteza e volatilidade.
Já a agenda de indicadores e eventos econômicos desta quinta-feira fica esvaziada no Brasil e mais carregada no exterior.
Por aqui, destaque apenas para o reflexo do atual cenário brasileiro na taxa de desemprego. O dado calculado pelo IBGE deve subir a 7,8% da população economicamente ativa (PEA) em setembro, atingindo o maior nível desde agosto de 2009, quando estava em 8,1%. Outro destaque no levantamento pode ser a marca de 2 milhões de pessoas no total da população desocupada, um salto em relação ao ano passado.
O dado será divulgado às 9 horas. Antes, às 8 horas, sai a prévia do mês da sondagem da indústria feita pela FGV. Na safra de balanços, o radar está no resultado trimestral da Vale, antes da abertura do mercado. A previsão é de que a mineradora tenha sido afetada pela variação cambial, reportando um prejuízo líquido ao menos três vezes maior que o apurado no terceiro trimestre do ano passado, com perdas agora na faixa de US$ 5 bilhões.
Ontem, as ações preferenciais (PNA) da companhia corrigiram a queda da véspera e subiram 2,7%, fechando na ponta oposta da Petrobras, que liderou as perdas com folga. Os papéis PN da estatal petrolífera caíram 3,7%. O giro financeiro do dia foi fraco, de cerca de R$ 5 bilhões.
Essa troca de mãos pode ter sido conduzida pelo fluxo de capital externo, que iniciou a semana mais modesto na Bovespa. Ainda assim, os aportes de pouco mais de R$ 35 milhões na última segunda-feira garantiram a alta do dia, de 0,45%. Ontem, o Ibovespa caiu 0,78%. Após o fechamento do pregão local, saem os números trimestrais das Lojas Renner. A Localiza também deve divulgar os dados financeiros, mas sem previsão de horário.
No exterior, as atenções se voltam para a decisão de política monetária do Banco Central Europeu (BCE), às 9h45. O anúncio será seguido de uma entrevista coletiva a ser concedida por Mario Draghi, às 10h30, e as declarações do comandante da instituição podem agitar os mercados globais. À espera desse grande evento, as principais bolsas europeias recuam, em meio às preocupações com o crescimento econômico global. O euro está de lado.
No mesmo horário em que Draghi começa a falar, serão conhecidos, nos Estados Unidos, os pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos nos país. Depois, entre 11h e 12h, saem dados sobre o setor imobiliário, além dos indicadores antecedentes da economia norte-americana em setembro. Na temporada de balanços, saem hoje os resultados trimestrais da 3M, Amazon.com, AT&T, Caterpillar, McDonald’s e Microsoft.
Em Wall Street, os índices futuros ensaiam ganhos, em uma tentativa de recuperação após as perdas dos últimos dois dias. A caça por barganhas no petróleo ajuda o movimento em Nova York. Já na Ásia, o sinal continuo sendo misto: Xangai subiu 1,46%, mas Tóquio e Hong Kong cederam 0,64% e 0,74%, respectivamente. Entre as moedas emergentes, a rupia indonésia e o dólar neozelandês têm os maiores ganhos da sessão ante o dólar.