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Especial: relações comerciais China-Brasil em suspense


A combinação de uma moeda local desvalorizada com uma proposta de estimular a ampliação dos investimentos pode culminar em uma rota de fuga para o Brasil pelo exterior, onde um dos principais parceiros comerciais, a China, vem tentando impor novas ordens econômicas.

À primeira vista, movimentos bilaterais feitos pelo país asiático, como projetos de infraestrutura na Argentina e a retomada da rota da seda na Europa, podem ser lidos como uma ameaça ao comércio nacional. Mas é preciso entender que tais passos se dão em direção de algo mais engajador.

O economista e professor da Unesp Luís Antônio Paulino, diretor executivo do Instituto Confúcio, diz que a proliferação de acordos bilaterais tem a ver com a paralisação da Rodada de Doha. Ele se recorda da posição brasileira favorável às negociações multilaterais, e diz que os acordos entre duas partes “são muito desiguais e impõe regras mais rígidas”.

O mote desse movimento direto entre os países, explica Paulino, está na necessidade de crescimento econômico. “A China enfrenta dificuldades de crescimento, com a desaceleração global, e é natural que o país procure acordos que facilitem relações de comércio”, avalia.

Mas mesmo a tentativa de salvação externa já não garante tanto êxito. Estudos recentes do Departamento de Estudos e Pesquisas Econômicas (Depec) do Bradesco mostram que nos últimos três anos, o comércio mundial tem mostrado sinais de fraqueza, acumulando crescimento bem abaixo da média histórica, diante de mudanças estruturais que se somam ao ciclo econômico.

Essa perda de ímpeto das transações globais fizeram com que as exportações brasileiras registrassem, na variação acumulada em 12 meses, a retração mais forte desde a crise de 2009. Então, ao buscar a assinatura de acordos bilaterais de trocas é possível que os países envolvidos consigam desencadear ainda mais o potencial do comércio internacional, principalmente em momentos em que a economia global não vai bem.

Lição de casa. Portanto, por mais que acordos comerciais entre China e Argentina, por exemplo, parecem ter acentuado a queda das exportações brasileiras para o país vizinho, cabe ao Brasil buscar competividade. “O comércio internacional é baseado em vantagens comparativas e as fortes vantagens econômicas do Brasil já estão dadas, são claras”, afirma Yao Wei, economista de China no Société Générale (SocGen), ressaltando principalmente o comércio brasileiro de produtos agrícolas.

Também do Depec do Bradesco, a analista internacional Fabiana D’Atri afirma que vislumbra oportunidades e também desafios para as exportações do agronegócio brasileiro para a China nos próximos anos, especialmente nas cadeias de soja e de carne bovina. “Olhando à frente, as perspectivas de demanda chinesa são promissoras, mas as estratégias de produção da China também são audaciosas”.

Nesse sentido, Wei, do SocGen, lembra que a China reconhece a importância das relações comerciais com as economias emergentes, mas ressalta que o próprio país tem muito problemas internos para serem conduzidos. “Então, é mais o foco doméstico chinês, que quer garantir um crescimento econômico sustentável, do que qual papel do país vai eventualmente beneficiar muitos de seus parceiros comerciais”.

Ela acrescenta que “políticas governamentais claras e estáveis, além de um sistema legal transparente” são pilares fundamentais nas negociações entre os gigantes emergentes do Ocidente e do Oriente. “Não faz muito diferença se o aporte vai ser para o Brasil ou em outro país, é isso que a China vai olhar e é o que vai atrair investimentos chineses”, completa a economista, ponderando desconhecer mais profundamente as incertezas políticas vindas de Brasília e os efeitos delas na tomada de decisão dos investidores.

Equilibrando a balança. Os especialistas em China consultados pelo blog Bula do Mercado lembram que, por trás do rebalanceamento econômico chinês, que busca apoiar a infraestrutura no mundo emergente e resgatar o consumo interno do país, está também uma importante disputa geopolítica. Nesse contexto, o Brasil é um aliado importante.

O professor Paulino diz que a segunda maior economia do mundo lidera um papel estratégico que tem colocado em questão acordos antigos, como o Consenso de Washington, contestando essas regras e a regulação do sistema financeiro, o que, em contrapartida, traz preocupações para quem hoje domina a governança global. “Isso de certo modo incomoda não só os Estados Unidos, mas também um arranjo com Fundo Monetária Internacional (FMI), Organização Mundial do Comércio (OMC) e Banco Mundial”.

Wei destaca a relevância da criação do banco asiático de infraestrutura (AIIB, na sigla em inglês), do qual o Brasil também faz parte, a fim de estreitar as oportunidades de investimento e endurecer um núcleo de força já criado pelo acrônimo BRICS. “A China tem uma visão de que o mundo emergente precisa trabalhar junto para encontrar uma solução para melhorar a questão do investimento produtivo”, explica a economista do SocGen, para quem o mundo emergente deve se unir e trabalhar juntos.

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